quinta-feira, 29 de maio de 2008

'Não adianta disfarçar' (por Daniel Lélis)


Ninguém vai te esperar. Nem você sabe onde deixou seu par de óculos. Sem abrir os olhos não há como as luzes te guiarem. Você vive fingindo ser o maior, mas sabe que seu pesadelo pode ser o sonho de quem te observa. Querem te calar sempre e poucos se importam se você chora. É melhor mesmo sentar num lugar qualquer dentro das suas próprias esperanças. Aproveite para puxar assunto com a pedra que te vigia. Ela com certeza estará lá sempre que precisar ser ouvido.
Não adianta querer acreditar que tudo pode ser diferente se nem mesmo você sabe o caminho que anda.
Tudo fica tão claro, mas não há nada mais a te consolar. São só palavras vazias enchendo qualquer espaço frouxo das suas memórias.
E os outros estão lá, admirando a sua própria covardia. Todos sentem que fazem falta, mas ninguém entende o por quê disso. Ora, não há sensatez maior que reconhecer o quanto podemos ser invísiveis.
E procuram em você qualquer coisa. Depende da hora. Talvez você seja o amigo. Talvez o conselheiro. Talvez "qualquer um". Isso não deve te doer. Há coisas mais terríveis para você se preocupar.
Por mais que tudo seja tão belo, seus olhos só enxergam mais um dia. E tudo parece te engolir de uma só vez.
Você finge que não me conhece. Mas sabe que eu estou aqui te amando em segredo.
Você finge ser o homem mais sério do mundo. Mas sabe que não suportaria a primeira interpretação.
Você finge estar triste. Mas até o teu sorriso te condena.
Você finge estar passando pelos maiores dilemas. Mas sabe que o maior deles é a louca tentativa de não ser você.
Você é tão confiante em si. Mas não sabe onde guardou a chave do seu coração. Aliás, até hoje você mesmo não entende as lágrimas deixadas lá.
Você é o mais belo. Mas sabe que o espelho não é seu amigo.
Você é o mais inteligente. Mas nenhum livro teve a honra de te conhecer.
Você pinta a imagem que qualquer tolo pode acreditar, mas insiste em usar pincéis sem cor.