quarta-feira, 22 de setembro de 2010

'Enquanto o amor incomoda, o ódio faz as suas vítimas' (por Daniel Lélis)


“Quando eu estava no exército, me deram uma medalha por matar dois homens e me dispensaram por amar um”(Leonard P. Matlovich)



Mãe segura desconsolada foto do filho Alexadre Ivo, menino de apenas 15 anos que foi brutalmente assassinado por um grupo de skinheads no dia 21 de junho. A razão: era homossexual. 

            As pessoas costumam apontar muitas razões para o porquê de a sociedade estar cada vez menos afeta àqueles valores que, edificados através de um processo histórico, revelaram-se indispensáveis para a manutenção da convivência pacífica entre os homens. Eu poderia, querido (a) leitor (a), apontar aqui muitos desses motivos. Porém, além de correr o risco de cansá-los, poderia cair na armadilha de limitar a um punhado de circunstâncias a construção dessa desagradável realidade. Por isso, resolvi escolher aquele que julgo ser a raiz de todos os problemas que envolvem a humanidade desde as eras mais longínquas: a ausência de amor no coração das pessoas. É ela, no meu entender, a mola propulsora de barbaridades que põe em cheque o grau de civilidade que nos gabamos de ter em relação aos outros animais. Sem amor, não há respeito, cooperação. Não há união, nem muito menos compreensão. A vida perde o seu sentido mais nobre, mais dignificante. É porque nos falta amor que casos trágicos como o do menino Ivo acontecem tão frequentemente.
            Chegamos ao ponto de que o que mais incomoda não é a miséria, as guerras, a violência urbana, a corrupção e tantas outras mazelas presentes em nosso cotidiano, mas sim a demonstração de afeto e carinho entre duas pessoas do mesmo sexo. É o beijo gay que assusta, enoja, atemoriza. O banho de sangue promovido por bandidos nos grandes centros brasileiros não importuna tanto quanto um casal de homossexuais que andam de mãos dadas nas ruas. Não é o político malandro que enche as meias e cuecas com o nosso dinheiro que nos tira o sossego, mas sim a travesti que, sem alternativa, vai trabalhar nas ruas como prostituta. Não são as catástrofes naturais, frutos da nossa ignorância e irresponsabilidade, que nos preocupam, mas sim o fato de dois homens que se amam quererem casar. Ficamos mais inquietos diante de uma parada gay que diante da marginalidade que rouba a infância e a juventude de muitos dos nossos jovens. Ficamos mais impressionados com o que fazem duas pessoas entre quatro paredes que com o caso do menino que foi morto dentro da própria sala de aula por uma bala perdida. E isto tudo por que, amigos? Porque, em nome de dogmas e sob o pretexto de estar defendendo a ‘moralidade e os bons costumes’, passamos a nos incomodar mais com o amor que com o ódio. Passamos a amar menos e a odiar mais. Passamos a reverenciar o preconceito, essa doença que mata, de tal modo que reclamamos o direito de pregá-lo em nossos espaços de convivência. Para tanto, usamos e abusamos do nome de Deus. Deus este que sendo o próprio amor, envergonhar-se-ia com tristeza do rumo que tomamos.


Daniel Lélis

Artigo publicado originalmente na Jfashion, a revista de sociedade mais badalada de Tocantins.